Publicado em 28 de agosto de 2020
“A mulher que passou pelo processo de alisamento do cabelo não passou porque quis, passou por conta de um contexto histórico, por conta de um racismo estrutural onde não se via beleza no cabelo da mulher negra. Eu percebi que essa discussão sobre o processo de transição da mulher negra, do cabelo da mulher negra, era uma discussão bastante relevante e que precisava ser pesquisada, precisava ser observada.”, conta Layse Barros dos Santos, egressa de Serviço Social, sobre seu Trabalho de Conclusão de Curso (TCC): “A ditadura dos cabelos lisos”.
O artigo recebeu o título “A ditadura dos cabelos lisos” e foi produzido com o objetivo de investigar os motivos e as consequências do processo de alisamento e de transição capilar passado por mulheres negras. A pesquisa traz estudo e observação sobre a relação do cabelo crespo com os espaços ocupados por essas mulheres no mercado de trabalho, sobre o contexto histórico e social que impacta a vida de pessoas negras, além de analisar a razão do processo de alisamento e processo de naturalização dos cabelos.
Na construção do trabalho foram realizadas 18 entrevistas com mulheres negras que passaram ou estavam passando pela transição capilar. Também foi utilizado um questionário para obter dados e informações sobre o tema. Ao todo, o estudo reúne 3.150 respostas. As perguntas tinham três etapas: a primeira parte abordava sobre o cabelo como identidade; a segunda era sobre os processos de alisamento que as mulheres passavam ao longo da vida; e a última questionava sobre os processos de aceitação e de naturalização do cabelo crespo.
A pesquisa explica que o cabelo crespo, sendo uma característica da identidade negra, é marcado por um processo de rejeição e preconceito vindos ainda da época do sistema de escravidão. Além do racismo e preconceito sofrido ao longo da vida, as mulheres negras passam também pela pressão de um padrão de beleza norte-europeizante imposto pela sociedade.
As opressões vivenciadas, além da autoestima prejudicada, influência na decisão de transformação e alisamento do cabelo com produtos químicos.
“O racismo é com a cor da pele, com os traços característicos da pessoa negra. Mas ninguém fala do preconceito que a mulher passava por ter um cabelo crespo. Por isso eu acredito que o TCC foi uma contribuição, porque a gente discute, a gente une as nossas forças”, afirma Layse Barros.
O TCC enfatiza ainda que, geralmente, os processos químicos capilares são realizados ainda durante a infância. Geralmente, a influência de familiares, amigos, igreja e escassa representatividade nos programas de televisão interferem na construção de identidade da criança e da adolescente. Layse Barros avalia que muitas meninas que crescem com o cabelo alisado perde a memória de como de fato é o formato e textura dos fios naturais.
O tema do trabalho, que foi escrito em 2016, se torna cada vez mais atual e ganha cada vez mais espaço para ser debatido. O assunto foi tratado em um curta metragem, “Amor pelo Cabelo (Hair Love)”, vencedor do Oscar 2020, onde retrata a história de uma menina negra passando pelo processo de aceitação do seu cabelo, focando na importância do cabelo na construção da identidade, e no papel dos pais durante todo esse momento.
Por Isadora Mota